foto: arquivo C.M. Sobral. M. Agraço |
Estávamos no ano de 1942 e, numa noite muito quente de Julho, houve cinema na Praça Dr. Eugénio Dias, projectado na parede do Solar dos Condes de Sobral. O Teatro Eduardo Costa estava fechado por degradação e o Cine-Teatro era só um projecto.
A nossa praça nessa época tinha como plantas ornamentais árvores de frutos, ameixoeiras; os frutos quando estavam maduros eram apanhados e distribuídos pelas escolas, mas muitos eram desperdiçados porque caíam de maduros. Acabou o filme e cada um regressou às suas casas tranquilamente, mas a noite não foi tranquila porque alguém se lembrou de surripiar as ameixas.
Na manhã seguinte, a vila foi acordada por um grande burburinho: todos os homens que tinham estado na Praça na noite anterior foram notificados para irem à Câmara(Paços do Concelho) prestar declarações e muitos foram presos, principalmente aqueles que faziam oposição ao Administrador do Concelho.Toda a Vila viveu um pesadelo, com os seus homens ameaçados, presos e multados. Conforme iam sendo interrogados todos se disseram inocentes, mas não lhes valeu de nada, ou pagavam a multa ou continuariam presos… e assim a pouco e pouco todos foram pagando a multa. Só permaneceu preso o Afonso Flor, o maior adversário da política de Zeferino da Silva, negando-se terminantemente a pagar a multa… Por que teria de o fazer se não tinha tocado nas ameixas?
As irmãs preocupadas com a sua saúde, temendo pelo irmão, por ele ser doente e a cadeia não oferecer condições de higiene e ser muito húmida, foram à socapa pagar a multa. Ao fim de cinco ou seis dias lá saiu ele, mas pensando que os tinha convencido da sua inocência! … Só muito mais tarde soube que lhe tinham pago a multa.
Este assunto foi falado anos e anos a fio, as pessoas sempre indignadas, e claro que era o Administrador do concelho o alvo das críticas, mas esta era também a sua táctica: não foi esta a primeira nem a última perseguição, ele trazia as pessoas controladas pelo seu poder. Os habitantes da vila davam largas à sua imaginação a pensar quem realmente teria apanhado a fruta… Se alguém sabia nunca o tornou público, com medo de represálias.
Sessenta anos depois, estava eu no meu trabalho e entrou um cliente para comprar vinho: era um sobralense que já não vive no Sobral há muitos anos e que naturalmente me cumprimentou. E como conversa puxa conversa, veio à baila a acção do Senhor Zeferino da Silva, o dito Administrador do Concelho,por ser tão ditador e não respeitar os seus munícipes. “Ainda não serias nascida, mas deves-te lembrar de ouvir falar do caso das ameixas” - disse-me ele. Sim, lembrava-me perfeitamente de ouvir falar, mas nunca se soube quem as teria “roubado”. Este roubado está entre aspas porque nunca foi considerado um roubo, só a maldade dos homens o considerou: as ameixas estavam num espaço aberto, seriam da população, e ainda por cima a maior quantidade caía no chão de madura. Contou-me então esse Sobralense que ele e mais uns outros, na altura garotos de treze e catorze anos, se lembraram de apanhar as ameixas nessa noite. Fiquei estupefacta… foram precisos tantos anos para que eu soubesse o que realmente se tinha passado e penso que muita gente, inclusivamente os da minha família, morreram sem saber a verdade dos factos.
Lembrei-me então da fábula do lobo e do cordeiro, em que o lobo acusou o cordeiro de lhe turvar a água. Como podia ser, se o lobo é que estava mais perto da nascente, disse o lobo: “Se não foste tu foi o teu pai!” E assim o lobo teve justificação para cometer a carnificina, e comer o pobre do cordeiro. No Sobral passou-se o mesmo: os pobres inocentes cordeiros sofreram com a prepotência de um homem, culpando-os e multando-os por um acto que até poderia ter algo de grotesco, e de que se fez uma tragédia.
Este Senhor fez durante muitos anos o papel de lobo e tinha a seu lado “carneiros” dispostos a acusar os pobres dos cordeiros. Assim se viveu no Sobral sobre uma ditadura “presidencial”
Texto: Maria Alexandrina Reto
Ainda hoje há gente desta, uma maneira de cobrar impostos , hoje tem ordem de aumentar os IMI,s sempre ganham mais e mais cedo pois é em Abril que eles ganham para ir de férias
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